Hoje a manhã começou com um sermão. Daqueles bem característicos de quem é mãe. Daqueles que só as mães sabem dar. O chamado “sermão maternal”.
O sermão maternal pode vestir-se de várias formas. Normalmente é comprido e parece não ter fim. Quando julgamos que já terminou, há sempre mais qualquer coisa a acrescentar. Aí, o sermão alonga-se mais um pouco.
O sermão maternal é então muito comprido. Ponto parágrafo. E dentro deste, há variações.
Existem aqueles sermões que são proferidos numa voz calma e baixa, que quase faz adormecer. Existem os sermões bem altos, que ouvimos nós e todos os vizinhos do prédio. Depois existem os sermões que se fazem acompanhar de gestos e que, se tiverem a ver com alguma coisa relacionada com arrumações, se revestem de ultimatos do género: “quero isto tudo arrumado em cinco minutos”. Há também os sermões que fazem chantagem emocional e que apelam ao sentimento e arrependimento dos filhos: “estou muito desiludida, nunca pensei que isto fosse acontecer”. Os sermões ameaçadores são aqueles que, depois de mil e uma palavras, terminam com uma frase do tipo: “se isto voltar a acontecer, nem sabes o que acontece” (normalmente as mães também não). Os sermões autocentrados são sermões onde, em todas as frases que o compõem, aparece a palavra eu: “eu com a tua idade fazia assim”; “eu nunca fui dessa forma”; “eu sempre respeitei os meus pais”. Também existem os sermões que são, do princípio ao fim, um queixume interminável: “é sempre a mesma coisa” “sobra sempre para mim” “sou sempre eu a fazer tudo” “vocês também nunca querem saber” “estou farta de dizer sempre a mesma coisa” “parece que estou a falar para o boneco”.
O sermão de hoje de manhã foi uma mistura de dois – foi proferido numa voz calma e baixa e apelou ao sentimento e arrependimento da minha filha mais velha.
Noutro dia teria sido ainda mais comprido. Hoje não foi. E não foi, porque enquanto o estava a vomitar comecei a entender o quão ridículo estava tudo aquilo a ser. Percebi que aquele sermão apenas me servia a mim.
O sermão maternal está embebido em esperança. Esperança de que o comportamento não volte a acontecer. Esperança de que os nossos filhos mudem. Esperança naquelas palavras, que depois de atiradas para o ar sejam capazes de, como por magia, transformar o mau em bom.
No entanto, nada disto é verdade. O sermão maternal apenas afasta. Não junta ninguém, nem muda comportamentos. Depois da segunda frase, os nossos filhos já desligaram (se é que não desligaram antes). E ficamos nós, mães, a falar para nós próprias, a deitar fora as nossas frustrações, as nossas idealizações, os nossos azares.
Hoje de manhã senti isto. Senti literalmente isto. E foi quando senti isto que me calei. E voltei para a casa-de-banho. E voltei para o meu cabelo, que estava a secar. E olhei-me ao espelho e pensei: “Que ridículo. Nada do que lhe disseste serviu. Nada disto fez sentido”. Encolhi os ombros. E percebi que o sermão maternal só nos serve mesmo a nós, mães. E percebi que o sermão maternal nos anda a iludir há anos, porque ele não cumpre o que promete – mudar comportamentos.
E a partir de hoje vou tentar fugir aos sermões e vou passar a convidar os diálogos para fazerem parte da relação com as minhas filhas.
Um diálogo que me respeite a mim, que respeite os meus limites e os meus sentimentos e um diálogo que as respeite também a elas, numa perspectiva de igual valor.
For Love, With Love ❤️
IrinaVazMestre
|Psicóloga & Facilitadora de Parentalidade Consciente|
Acompanhamento Parental – Apoio Psicológico – Workshops
irina.vaz.mestre@gmail.com
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