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Foto do escritorIrina Vaz Mestre

Acusações

No outro dia fui assaltada por acusações que, como é normal em qualquer acusação, poderia ter levado a uma defesa.

Não me defendi. Nem neguei o inegável.

Hoje quero partilhar contigo o que decidi fazer, quando a minha filha do meio me acusou de não ter tempo para ela.

As palavras, em jeito de acusação, surgiram quando eu estava a tratar da mana bebé. A Cocas estava a chorar, porque precisava de dormir. Chorava, a bom chorar, e é curioso observar que é quase sempre quando a Cocas está a chorar que a C. aparece para me pedir atenção, o que me deixa sempre muito inquieta, por não conseguir atender às duas em simultâneo, e normalmente da forma que ambas querem.

Desta vez veio pedir-me que a ajudasse a procurar um brinquedo que não encontrava. Disse-lhe, no meio de muito choro, que o fazia logo assim que acabasse de tratar da irmã. Não concordou (é claro que não!), e desatou também ela a chorar. E a gritar.

Fervi por dentro. Quase que soltei um grito. Daqueles desesperados, que pedem ajuda (não tinha a quem pedir). Tentei acalmar-me. Três a fazer birra é que era mesmo insustentável (a terceira birra era a minha).

E foi entre esta minha tentativa de me acalmar e o choro das duas filhas mais novas, que a C. me disse, soluçando, que nunca mais lhe dera atenção desde que a Cocas tinha nascido. Que já não queria saber dela para nada e que só andava com a Cocas para todo o lado. Fez ainda questão de salientar que odiava esta irmã.

E quando ouvi tudo isto, surpreendentemente, não me defendi. Não neguei o inegável. Não lhe disse que não era nada disso. Não lhe disse que ela estava enganada. Não lhe disse que isso não era verdade. Não lhe pedi para não ficar assim. Não lhe disse que tudo o que estava a dizer era um disparate, porque eu gosto das três da mesma maneira.

Fui inundada por uma compaixão enorme e, por isso, resolvi defender, não os meus, mas os sentimentos dela. E optei por reconhecer o que ela estava a sentir, dizendo: “Oh, deve ser difícil para ti teres uma irmã tão bebé que precisa tanto dos meus cuidados. Deves mesmo às vezes sentir-te muito farta que seja assim e, nessas alturas, deves mesmo odiá-la. E é mesmo verdade quando dizes que estou sempre com ela. Que chato deve ser isso para ti! Queres encostar-te a mim enquanto termino aqui com a Cocas?”.

E no meio deste reconhecimento, sentiu-se acolhida para deitar cá para fora o que estava a sentir e continuou a chorar e a falar. Sentiu-se confortável na sua zanga, no seu ódio, na sua irritação. Acho também que não deve ter sentido culpa por se sentir assim, nem se deve ter sentido julgada ou ameaçada.

E eu confirmei o que já sabia, o que tenho aprendido nesta jornada da Parentalidade e o que tenho vindo a dizer às outras famílias que ajudo profissionalmente: reconhecer os sentimentos dos outros é a melhor forma de criarmos conexão e de nos unirmos numa relação mais próxima e cúmplice.

Reconhecer não significa aceitar, ou concordar, ou até mesmo resignar. Reconhecer só significa isso mesmo: reconhecer o outro na sua essência, escutá-lo sem julgamentos e reconhecer que para o outro, é assim, daquela maneira, naquele momento. E isso basta para o outro se sentir visto, olhado e respeitado!

E é mesmo verdade, querida filha: desde que a Cocas entrou na nossa família, que a minha atenção se repartiu por ela também. Já o meu Amor (e sei que o teu também, porque vejo a forma como sorris para ela) multiplicou-se como eu nunca imaginei que pudesse voltar a acontecer.

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IrinaVazMestre

| Psicóloga & Facilitadora de Parentalidade Consciente |

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